AS LIÇÕES DO CETA PARA O MERCOSUL
A semana agitada de negociações finais do
CETA, sigla em inglês para o Acordo Abrangente Econômico e de Comércio entre o
Canadá e a União Europeia, que ainda precisa ser ratificado pelos 36
parlamentos dos estados-membros da UE, deixou lições importantes para a
realidade que enfrentamos nas negociações entre o Mercosul e o bloco europeu.
A primeira é que as declarações de ministros
brasileiros, de que o acordo será concluído em 2018, demonstram claramente a
falta de conhecimento sobre o que estão falando. E denunciam uma certa
ignorância sobre o funcionamento do sistema. O acordo entre um único país — no
caso, o Canadá — e a UE levou sete anos para ser fechado — e sua assinatura foi adiada por uma razão que
parece estranha aos ouvidos de quem imagina que acordos como esse se resolvem
com uma ordem de cima para baixo. Uma única província da Bélgica, a Valonia,
que abriga menos de 1% da população europeia, rejeitou o acordo. Isso obrigou à
renegociação das 1600 páginas do acordo e levou à inclusão no documento de quatro
novas páginas com as propostas dos valões.
O Mercosul não exige que os acordos
internacionais sejam ratificados em referendos. Mas há divergências às vezes
intransponíveis entre os pontos de vista dos países membros. A atual situação
da Venezuela — país no qual a União Européia tem fortes interesses econômicos
—, por exemplo, torna o processo de negociação especialmente complexo. No
passado recente, a Comissão Européia, através de sua Direção de Comércio, tinha
um mandato negociador que ignorava os movimentos sociais, os estados membros e
o próprio Parlamento europeu.
Hoje a situação mudou. Não só pelo fato de a
ratificação dos tratados precisar ser feita pelos parlamentos regionais (como o
caso da Valonia, que abriga as comunidades germânica e flamenga da Bélgica),
mas também porque muitos governos europeus levam a ratificação a consulta
popular. Recentemente, a população holandesa rejeitou o acordo entre UE e
Ucrânia. Em resumo: os burocratas da Comissão Europeia, adorados pelos
burocratas do Mercosul, podem negociar o que quiserem. Mas o que eles acertam
precisa do respaldo dos outros atores políticos da UE. Para usar a velha gíria
do futebol, se não “combinar com os russos”, não tem acordo.
Como o Brail é, querendo ou não, o país
líder do Mercosul e tem a maior rede e o maior peso diplomático entre os países
membros da região, é provável que o papel de negociar os termos do acordo sobre
para sua diplomacia. É ela quem terá que obter o mandato dos demais sócios do
Mercosul e se desdobrar para convencer
Como o Brasil, é querendo ou não, país líder
do Mercosul e tem a maior rede diplomática nos países da UE, é provável que
esse papel sobre para convencer todos os atores políticos e econômicos na
Europa de que o acordo é bom para eles.
O episódio envolvendo o Canada, um pais
amigo "mal tratado", como disse a ministra canadense de comércio
internacional, mostra a nova face dos acordos internacionais firmados pela
União Europeia. Atualmente, a UE está negociando cerca de 20 acordos
comerciais. Um deles, com os Estados Unidos.
O jogo mudou. Não começou um segundo tempo.
Começou um novo jogo, diferente e mais complexo. E essa complexidade passa pela
própria situação europeia mas pelas próprias mudanças ocorridas nos países do
Mercosul. Prometer resultados num cenário como esses pode gerar frustrações. O
acordo com o Canadá está aí para não nos deixar mentir.
Contar com o acordo entre o Mercosul e a UE para
a expansão dos negócios internacionais do Brasil é difícil, senão impossível, a
médio prazo. A solução, talvez, seja encontrar outros caminhos, como uma
parceria estratégica entre o Brasil e a UE. Talvez seja mais fácil e rápido
buscar acordos específicos, como na área de ciência, ou reforçar as relações
bilaterais. Algo que, aliás alguns estados membros da UE, como a Itália,
Franca, Alemanha, já estão fazendo. O tempo é de novos desafios. Sem ilusões e declarações
sem fundamento.
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