DE FIDEL CASTRO E MINAS
A morte aos 90 anos do líder revolucionário ou ditador cubano (depende do ponto de vista, mas provavelmente os dois), Fidel Castro, recolocou no mapa mundi a discussão sobre o seu papel na história mundial. Mas, para analisar esse papel, é preciso olhar primeiro a história de Cuba, que foi o último país latino americano, no final do século XIX, a se liberar do jugo espanhol e depois ganhou a guerra contra os Estados Unidos, que queriam ocupar a ilha e transformá-la, como aconteceu com Puerto Rico, em território norte-americano. Aliás, parte da ilha, onde estão as instalações militares norte-americanas e a prisão de máxima segurança para terroristas islâmicos, Guantánamo, é território dos Estados Unidos. E se olhar o mapa da América Latina e do Caribe, do Sul para o Norte, você identifica que a cabeça do continente se chama Cuba, a 150 km de costa norte-americana ou da capital dos ricos latino-americanos, chamada Miami.
Cuba foi um país dos mais desenvolvidos do continente numa determinada época da historia, mas também foi se transformando em filha prostituta dos Estados Unidos, com a máfia dominando os negócios e a desigualdade social aumentando, ao mesmo tempo em que a ditadura do nefasto Fulgencio Batista fazia inveja a outros ditadores mundiais. Foi nesse ambiente de desejo de mudanças sociais que nasceu a guerrilha cubana, na contra mão de um mundo bipolar de guerra fria e de um anti-comunismo crescente, em especial nos Estados Unidos. Ter um país ideologicamente diferente e aliado ao inimigo número um, a União Soviética, era inaceitável para todos os dirigentes estadunidenses, inclusive o liberal John Kennedy.
O encanto romântico de uma solução socialista como a cubana foi impregnando multidões de jovens. Assim, a condecoração de outro líder cubano, Che Guevara, pelo governo de Jânio Quadros, desencadeou uma crise político-militar no Brasil, cujas consequências mais tarde levaram ao golpe militar de 1964. Os jovens revolucionários brasileiros combatentes da ditadura militar, como o mineiro Jose Dirceu, hoje preso por corrupção, foram treinados em Cuba. A Ilha, como era chamada por esses jovens, sob a liderança de Fidel Castro, era a matriz de exportação de idéias, ideais e guerrilha, para uma mudança de regimes no continente. Os jovens treinados lá, quando conquistaram o poder no Brasil, ativaram seus contatos com Cuba, como um deles, o ex-deputado Tilden Santiago, que chegou a ser embaixador brasileiro em Havana.
E claro, começou um novo ciclo de relacionamento, que após a aventura militar em Angola, onde 35 mil soldados cubanos combateram os sul-africanos e seus aliados da Unita, teve seu auge com a vinda de milhares de médicos cubanos para Brasil (o que ajudou Cuba a superar seus problemas financeiros), financiamentos para construção do porto de Mariel (na gestão do então Ministro de Desenvolvimento Fernando Pimentel e seu diretor no BNDES, Mauricio Borges) e mais outros projetos menos conhecidos. Os treinados lá, ou nas idéias e ideais de lá, devolveram a bolsa de estudos com juros e correção monetária.
Mas, é pouco e inadequado dizer que a influência cubana e de Fidel Castro se resumem a isso. Um sistema político fracassado na área de economia, absolutamente hermético quanto aos direitos de cidadãos, só está sobrevivendo porque manteve coerência ideológica em um socialismo que fracassou, mesmo que se cante em verso e prosa seu sistema de saúde e de educação. Fidel Castro manteve Cuba em seu modelo próprio, balançando em um mundo de mudanças, no nariz dos Estados Unidos. Interessante observar que, ao contrário de países do antigo Leste Europeu, a liberdade religiosa em Cuba tem um grau maior do que tinha lá, mas a liberdade de expressão continua zero.
Fidel Castro fez história e não há como não reconhecer isso. O que não quer dizer que ela é tão bonita e charmosa, ou tão boa para o povo cubano, como foram os sonhos, o charme e esperança de tempos melhores que emanavam em 1959, quando tudo começou na Sierra Maestra.