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Thursday 19 June 2014

Dos trilhos do Sudão do Sul

O Sudão do Sul tem para a maioria nome de um dos quase seis mil municípios brasileiros. Como há nomes de pessoas os mais diferentes do mundo, também  pode haver nomes de municípios os mais diferentes neste Brasil. E por que não esse? Porque esse é um país da África, recente, separado do Sudão, que tinha existido junto ao  Egito, do qual se separou com um algodão da qualidade de fazer inveja nas fábricas do falecido José Alencar. E a separação dos dois países foi violenta, principalmente porque a luta não foi de independência por independência, mas porque as grandes petroleiras acharam que podem ter mais lucros no Sudão do Sul do que em um Sudão unido e maior.

É nesse Sudão do Sul, rico em  petróleo, que esta jorrando à vontade, que neste final de ano surgiram conflitos armados de grandes proporções. A luta fratricida entre diversas etnias está deslocando milhares de pessoas, provocando milhares de mortes e uma fome que assustou o  mundo. As Nações Unidas vão enviar mais de seis mil soldados para a região e mais alimentos. Todas as potências mundiais estão pedindo que as partes em conflito cessem de lutar e iniciem conversações de paz. Tudo em vão, já que nem governo nem rebeldes foram suficientemente derrotados para iniciar negociações.

Mas, o susto que o mundo levou por se iniciar um conflito tão vigoroso em tão pouco tempo, com uma violência que beira o desastre humanitário, não deve ser menor do que o que levaram no Brasil os que estavam engajados em construir uma ferrovia naquele país. Uma empreiteira das alterosas, AG, conseguiu um empréstimo do nosso super banco de desenvolvimento nacional e social para construir mais de 500 km da ferrovia. Um empréstimo que a imprensa avalia em aproximadamente 1 bilhão de dólares ou mais de 2.3 bilhões de reais. E como o Brasil não fábrica nem trilho, segundo Jorge Gerdau porque o mercado não compensa, montamos locomotivas na fábrica da GE em Contagem que está ociosa, e os vagões têm mais partes importadas do que os carros de luxo, acrescentando que não temos mão de obra qualificada, essa obra seria boa para quem?  

Estourando a guerra, pode se que os responsáveis revejam os investimentos. Ou não, já que acabamos de cancelar dívidas de alguns países africanos no valor total de mais de dois bilhões de reais. A pergunta é se os nossos investidores, quando vão para exterior pendurados nas garantias e risco do BNDES, realmente analisam qual é a real chance de receber. Parece  que as lições mais recentes de penúria venezuelana pouco nos ensinaram. Enquanto a viúva estiver pagando as contas, por que se preocupar?

Stefan B. Salej
26.12.2013.
Das  caças e das bruxas

Simplesmente parabéns aos atores que decidiram cortar o nó  górdico da compra de aviões de caça. Resolveram comprar na Suécia, que ganhou o contrato de 4.5 bilhões de dólares, não por causa do financiamento de 15 anos, nem pela superioridade técnica, mas por causa da inépcia dos competidores, inábeis e prepotentes. A dos  franceses, porque o avião oferecido, que o ganhou o título de "não vendável" do venerado diário francês Le Monde e que, com o escândalo de propina da Alstom no Brasil, ficou vulnerável em excesso. A dos americanos que, com a Boeing, usaram o lobby da ex embaixadora norte americana no Brasil D. Hrinak, e ficaram vulneráveis com o escândalo das escutas. E mais: porque não deram garantia suficiente de transferência de tecnologia. E não  podiam dar, porque a legislação deles proíbe. E ninguém estava disposto a mudar lei no Congresso norte-americano.

Os suecos ficaram sozinhos, se excluirmos os russos, que têm tecnologia muito mais avançada, mas são russos e comprar deles ainda significa uma virada ideológica inexistente num mundo múltipolar de  potências grandes. A Suécia não é grande compradora de nossos produtos, portanto a nossa compra não aumenta as nossas exportações, o que seria o caso com os outros países. Os suecos, que ganharam o apelido de neutros, nem tão neutros são como se apresentam. O  fabricante de fósforos, que foram inventados lá, financiou os governos nazistas e  fascistas  e  a dinamite foi inventada  lá. E os livros do jornalista falecido Stieg Larsson, descrevendo as tramas de espionagem e o desumano tratamento de mulheres, que foram best sellers, não são ficção, mas a dura realidade sueca, que nem Rainha Silvia, de origem brasileira, pode esconder.  E os sul-africanos, que compraram os aviões Gripen, transação sob investigação, podem contar às quantas anda a satisfação com as caças.

Em resumo, não tinha para onde correr e um dia teve que resolver o caso.  O Brasil anda demasiado desprotegido e o atraso nos investimentos em infra-estrutura de defesa, para um país de dimensões continentais, são garantia de vulnerabilidade. O mundo  é um lugar perigoso e Brasil terá que investir mais também nessa área. A compra dos suecos prevê a fabricação das partes no Brasil, o que gera uma boa oportunidade para solidificar o crescimento de industria de defesa. O sucesso da EMBRAER e o  cluster da indústria de defesa em Sao José dos Campos demonstram que podemos vencer essa batalha. Na área naval também há avanços. E Minas, onde fica?  No clássico, onde sempre esteve. Mas isso não será suficiente para criar empregos. E o trem passa.

Stefan B. Salej
18.12.2013.
Da Oropa revivida

A Europa, com a sua União Européia e a sua união monetária,  chamada zona do euro, está envelhecida, talvez até cansada, mas continua firme, lá onde sempre esteve. Bem, com os últimos acontecimentos, um pouco mais adiante do que em tempos recentes. A Europa está se movendo de forma dinâmica e quem está apostando na sua decadência total pode perder.

Na área econômica e financeira, há avanços visíveis nas economias européias. Talvez nem tão rápidas como desejável, mas parece que o setor financeiro está sob controle, e o mais importante: o dinamismo competitivo das empresas líderes européias é visível. É o caso da Fiat, que ultrapassou as dificuldades domésticas e se firmou como um dos líderes  da indústria, nada menos do que nos Estados Unidos, com a compra da Chrysler. E isso vale para outras indústrias, inclusive para as espanholas que, apesar da crise doméstica, aumentaram em muito suas exportações. Grécia e Chipre são histórias de ajuste do passado e agora devem ganhar competitividade para o futuro.

A União Européia, que finalmente aprovou seu super bilionário  orçamento na semana passada, também mostrou as suas garras no acordo com o Irã. A pálida representante européia para política exterior, Lady Ashton, apareceu como a grande articuladora do acordo entre o Irã e as potências mundiais sobre a redução de atividades nucleares daquele país. Um acordo sem dúvida interessante para a Europa, que se abastece com petróleo do Irã e que, devido às sanções impostas àquele país, perdia um mercado interessante. Uma vitória do Pirro, já que o Irã ganha tempo e dinheiro para continuar o seu programa nuclear. O que o Brasil e a Turquia propuseram há alguns anos era muito melhor para o mundo do que o assinaram agora com tanta pompa.

Em outro front, a Ucrânia, grande celeiro de alimentos na porta da Europa, decidiu não se associar à União Européia. Sob protestos ou não, aquele país de 60 milhões de habitantes está na órbita da Rússia. E os russos, que na mesma semana assinaram 28 acordos de cooperação com a Itália na cidade de Trieste, deixaram claro que a União Soviética pode ter acabado, mas a Rússia continua firme e ativa. O urso não está dormindo.

E no campo político ficam algumas lições importantes. Após a queda do teto de um supermercado e lamentáveis mortes, o primeiro ministro da Latvia renunciou. O Parlamento italiano cassou seu ex-primeiro ministro Berlusconi. E os alemães, dois meses após as eleições fizeram a grande coalizão, para o bem do país e o mundo. As lições destes últimos anos reforçam a democracia e a chance de desenvolvimento europeu.


Stefan B. Salej
28.11.2013.







Da Cristina argentina

Um político saindo de uma operação e se recuperando é um  perigo público. No Brasil tivemos a experiência do Presidente Figueiredo, com o nosso Vice Aureliano Chaves. Em geral, pensam que foram traídos durante a sua ausência e que Deus os salvou para governarem ainda pior do que antes. É quase clássico que, depois de um período de recuperação, que lhes dá tempo suficiente para pensar de tudo e sobre tudo, voltem com novas idéias, uma revisão do passado e a firme convicção de que o futuro não  pertence ao Deus, mas a eles.

A volta triunfal de Cristina  Kirchner, a Presidente da República Argentina, após 47 dias de licença médica e, no meio, eleições parlamentares, à Casa Rosada, sede do governo portenho,, é um caso assim. Perdeu as eleições para o opositor Massi, não confundir com o argentino mas famoso do momento, o jogador de futebol Messi, em campanha para derrubar o kirchnerismo no poder,mas mesmo assim voltou exibindo uma alegria e força ímpares. Fez reforma  ministerial com a mão na cintura e mexeu onde mais dói  em cada cidadão, e também no argentino: no bolso, na economia.

Mandou o bode expiatório dos últimos desastres econômicos, G.Moreno, para um exílio dourado em Roma e nomeou para seu lugar um jovem declarado marxista, que tomou posse no Ministério da economia em uma Argentina ainda tradicional e engravatada, Axel Kicillof. O cenário da substituição do truculento, grosseiro, falsificador de estatísticas e vendedor de licenças de importação Moreno, por um jovem marxista mais próximo à realidade internacional, é o pior para os exportadores brasileiros. A política econômica, confusa e que não produz crescimento no país vizinho, continua. E, com essa política, é difícil fazer uma parceria que leve os dois países a crescerem mais.

Neste momento em que estamos apresentando a nossa oferta para negociações  com a União Européia, a estabilidade política e a oportunidade de  crescimento dos vizinhos são  fundamentais. Enquanto o Brasil oferece parceria de desenvolvimento, o governo argentino oferece barreiras. Cristina Kirchner, no seu discurso ao voltar ao governo, falou das falidas Aerolineas Argentinas, da petrolífera estatizada, mas nada do MERCOSUL que esta desafinado e nem da crise social que o país vive. E nem das reservas cambiais de 31 bilhões de dólares e nem do dólar no cambio negro alcançando o céu.

Vizinho em permanentes dificuldades e sem perspectiva de solução, é um problema para o Brasil. Nossas exportações para lá são importantes. Mas, vamos ter que esperar mais do que a saída da Presidente do hospital. Esperar que o país como um todo saia do hospital ou hospício.


Stefan B. Salej
20.11.2013.


 
Dos Andes

As atenções neste domingo estão em Santiago de Chile, linda capital chilena, às vezes exageradamente poluída, onde as eleições presidenciais devem, pelas pesquisas, consagrar pela segunda vez como Presidente a socialista Michele Bachelet. 40 anos após o assinado pelos militares do Presidente  socialista Salvador Allende e de um dos períodos mais sombrios da história humana no século passado, volta ao poder o socialismo. O Chile é um caso curioso entre as democracias latino-americanas. Já na época do Allende se dizia, entre os jornalistas que cobriam os acontecimentos, que não existia perigo do golpe militar. As instituições democráticas eram sólidas e as forças armadas, profissionais e comprometidas com a democracia.

Um dos maiores enganos da história. Com comprovada interferência dos Estados Unidos, caiu a democracia e começou a ditadura. E com ela, um dos regimes neo-liberais mais engajados que o mundo conheceu. No processo democrático que se seguiu, foi implementada a democracia representativa, as representações políticas clássicas de direita e da esquerda estão se alternando no poder, mas a economia, ainda altamente dependente de matérias primas, leia-se cobre, formou uma base capitalista de fazer inveja a qualquer um. O Chile, falando-se empresarialmente, é uma ilha de exceção na América do Sul. A economia é aberta, com acordos de livre comércio com a União Européia e outros países e empresas altamente competitivas e capitalizadas.

As empresas chilenas estão investindo no mundo inteiro. Compram supermercados em Minas Gerais e indústrias farmacêuticas na África do Sul. Os seus vinhos estão hoje nas melhores mesas em todo o planeta, mesmo se ninguém conhecia suas vinhas há trinta anos. Estão na área energética, bancos e tecnologia. Mas, a maior e mais importante empresa deles, chamada empresa de desenvolvimento e não de mineração ou exploração de cobre, a CODELCO, a PETROBRAS deles, continua estatal. Um modelo estranho para alguns, um misto de forte capitalismo doméstico, uma economia de mercado bem liberal, mas mão forte do Estado na área de desenvolvimento e interesses estratégicos.

Mas, tudo isso, mesmo com vários socialistas no governo, não foi suficiente para melhorar de forma significativa a qualidade de vida dos chilenos. O desemprego continua  alto, a educação ainda não está ao alcance  de todos e o novo governo da Bachelet terá que investir nisso. A economia de mercado sozinha não foi suficiente para fazer todos os chilenos felizes.

Stefan B. Salej
14.11.2013.    
Do "socialismo o muerte"

O ministério da felicidade do povo venezuelano que o Presidente Maduro criou não vai mudar a dura realidade da falta de alimentos e produtos essenciais, em um dos países mais ricos do planeta: a Venezuela. Os discursos inflamados contra a oposição, cujo líder, Capriles, foi recebido pelo Papa Francisco (que nomeou o ex-Núncio Apostólico em Caracas para o posto mais importante do Vaticano e portanto sabe o que acontece por lá ) não repõem as prateleiras dos supermercados. O país, grande exportador de petróleo para os Estados Unidos, também vive uma crise cambial. Os dólares no câmbio negro valem 30 vezes mais do que no câmbio oficial. E não há dólares no câmbio oficial para pagar as contas. As empresas devem no exterior, o governo não  lhes fornece  dólares, e o calote está na porta de muita gente. Mesmo as empresas dos países amigos, como o Brasil, não recebem. E os atrasos já estão ultrapassando alguns bilhões de dólares.

A crise venezuelana não tem origem no Chavismo. As origens montam à má gestão de recursos públicos há décadas. Uma corrupção endêmica e a falta de políticas sociais e de desenvolvimento levaram à quebra do Estado venezuelano há muito tempo. A chegada do  populista Chavez, a quem efetivamente o Brasil ajudou a assumir e a manter-se no  governo, foi só um episódio a mais na história quase trágica desse vizinho ao norte do Brasil. Chavez, ao seu modo e à sua maneira, quis dar uma resposta aos graves problemas sociais do rico país, mas de um lado ficou isolado enfrentando uma forte oposição dos Estados Unidos e de outro lado fez alianças que não lhe deram a sustentabilidade  no seu modelo de gestão do estado. E com um populismo sem par, aproveitou o preço alto do petróleo e simplesmente gastou o dinheiro. Nem desenvolveu o país, nem estruturou as finanças públicas, e destruiu a economia. O projeto de socialismo do século vinte, "Socialismo o Muerte", como cumprimentava a guarda presidencial os visitantes estrangeiros, virou, com o seu sucessor, lamentavelmente, " muerte del socialismo".

O Brasil, que empurrou a Venezuela para dentro do Mercosul e gerou uma crise da associação ainda não resolvida, tem no problema venezuelano um problema ainda maior. Em primeiro lugar, os não-pagamentos e a redução de mercado para as nossas exportações, afetam em muito as contas públicas brasileiras, sem falar da fragilidade das empresas. E o nó górdico da  situação política e econômica vai exigir muita, mas muita habilidade e parceria com outros países. Oxalá a crise não termine em banho de sangue.

Stefan B. Salej
6.11.2013.  
Do Mister e mistério X

Nenhuma notícia do Brasil na imprensa mundial e corredores dos poderosos das finanças nestes dias, por mais positiva ou trágica que seja, suplanta o noticiário sobre Industrial do Ano 2012 de Minas Gerais, ilustre mineiro de Governador Valadares, paladino do sucesso empreendedor nacional, Mr. X das empresas X ( antes multiplicação e agora mistério ) Eike Batista. Da fortuna de exatos 3 anos atrás, de 75 bilhões de reais (o valor da receita total do Estado de Minas neste ano), as empresas sempre denominadas X estão, com o último pedido de recuperação judicial da maior delas, OGX, valendo, por enquanto, 6 bilhões de reais. O símbolo do capitalismo nacional, exemplo aplaudido por apresentar a nossa capacidade de empreender, virou fumaça. E com ele, quem mais?

Fundos de investimentos e bancos estão assustados porque não se sabe como vão correr esses processos de recuperação judicial. Na verdade, há temor de que não sobre mais nada a receber. Quando o grupo do Eike deixou de pagar aos proprietários dos títulos que venciam em 1º de outubro, muita gente lembrou que, quando a distribuidora de energia CELPA no Pará quebrou, os detentores de títulos só receberam 17.5 %. Ou seja, por cada 100 dólares investidos, recebiam menos de 18 dólares e perdiam 76 dólares. Multiplique isso por milhões e veja quem ficou feliz.

No caso de Mister X, a pergunta principal é por que tantos investidores confiaram em um conglomerado tão fictício como o que ele construiu. A primeira resposta: todos acreditavam que, em caso do fiasco, governo não deixaria de comparecer. Dois, acreditava -se que a economia brasileira ia crescer mais do que cresce e que os ex-funcionários da PETROBRAS e ELETROBRAS, que deixaram as empresas para ganhar muito dinheiro com Eike, iam balançá-las a favor do grupo X. Nada disso aconteceu.

As consequências deste mistério do mister X são desastrosas. E em especial para Minas, onde além de estragos nos projetos que tocou, como a mineração Minas Novas e a fábrica de semicondutores, deixou um buraco do tamanho de um vulcão nas empresas mineiras que o homenagearam ano passado porque ele era o grande comprador. Muita gente tem muito a receber e dificilmente  verá este dinheiro.

Com o título de maior rombo latino-americano neste século, os investidores estrangeiros estão com medo de novos Eikes. O toque de ouro virou toque de prejuízo. E mais, ruiu o símbolo de empreendorismo falso, o que nem tão ruim no final das contas é.

Stefan B. Salej
31.10.2013.