DO GUARDA CHUVA E DO SEU DINHEIRO
Bernardo, filho do meu amigo, era aos oito anos um menino que ficou na memória da família, não porque chorava para ganhar sorvete, mas porque, ouvindo o tempo todo que MFM, Montepio da Família Militar, quebrou e todo mundo ficou sem dinheiro, chorou porque queria saber onde estava o dinheiro da sua poupança. Até que a mãe o levou à Caixa Econômica Federal, onde o caixa mostrou para ele o dinheiro da caderneta de poupança. Dinheiro vivo. Bernardo ficou feliz, estudou MBA nos Estados Unidos e ficou por lá, tornando-se diretor financeiro de grandes corporações.
Na outra ponta se dizia que banco só abre guarda-chuva no dia do sol. Ou seja, quando chove, banco não dá guarda-chuva. O Banco Nacional, que era patrocinador do Ayrton Senna, (as pessoas usam o boné com a marca do banco até os dias de hoje) dizia que dava guarda-chuva em qualquer tempo. Quando precisaram do banco, o guarda-chuva sumiu. E dizem agora, cash is king. O dinheiro está caro e, com esses juros no Brasil, ainda mais.
E por estes dias quebrou, nos Estados Unidos o Bank of Silicon Valley, banco das start ups. Advertido pelas autoridades monetárias várias vezes por irregularidades na gestão, os diretores não se abalaram. Jogaram os avisos no lixo, até que o próprio banco foi para lixo. E o sistema ficou abalado.
Na Suíça, há vinte anos se discute a gestão do segundo maior banco, o Crédit Suisse, até que ele, também abalado, foi adquirido pelo maior concorrente, o UBS, sob a direção segura das autoridades monetárias suíças. E com isso milhares de brasileiros que têm dinheiro lá ficaram aliviados, porque o dinheiro na Suíça só tem como garantia a boa gestão e nenhuma proteção do governo suíço. E como há mais de 500 bilhões de dólares de poupança de brasileiros no exterior, é bom pensar o que garante esse dinheiro. Aliás, é bom lembrar os depósitos de judeus nos bancos europeus antes da guerra, que sumiram durante a guerra, mesmo para quem sobreviveu o holocausto.
A questão é quanto os poupadores são protegidos contra má gestão, roubalheira e similares no sistema econômico. Pelo jeito, nos Estados Unidos o sistema de controle funcionou, mas mesmo assim mostrou muitas falhas que poderiam ter sido sanadas a tempo para evitar o problema. Na Suíça, gastaram vinte anos com uma tolerância ímpar com a gestão de Crédit Suisse para, um minuto antes da meia noite, darem uma solução. E na solução foram perdidos 17 bilhões de dólares de investidores.
No Brasil temos o caso da Lojas Americanas, 8 bilhões de dólares, que anos a fio paga mal os seus fornecedores, quebra-os sem dó. E os bancos não sabiam de nada? A autoridade de controle do mercado, a Comissão de Valores Mobiliários, analisava os balanços e também não viu nada? E os donos? Esses nem merecem menção.
Você tem um outro caso de cegueira econômica. O metrô de São Paulo, sob concessão, está todo santo dia funcionando mal. Conseguem até bater um trem no outro, coisa que nem na época da maria fumaça acontecia. E o poder público diz que mandou aviso e multou. E daí? Os trens continuam não funcionando.
Se a isso se adicionar a insegurança quanto a assalto, violência no trânsito e exacerbação política, desastres naturais provocados também pela negligência governamental, chegamos à pergunta: como somos protegidos pelo estado? No caso brasileiro especificamente os órgãos de controle controlam muito, mas dentro do princípio de que enxergam os detalhes, punem os pequenos e para os grandes há sempre uma solução. Claro que há exceções, como foi o caso das joias na alfândega brasileira, que tão somente confirmam a regra.
A democracia pressupõe o estado protegendo o cidadão. E por isso o estado precisa ser eficaz na chamada law enforcement, aplicação da lei. Caso contrário, a democracia se enfraquece.