DOS ACORDOS E DESACORDOS COMERCIAIS
As relações econômicas no sentido mais amplo de palavra são a base das relações diplomáticas e políticas entre os estados. Essas relações podem ser ou não traduzidas em acordos comerciais, ou muitas vezes em difícil entendimento entre os países que beiram mais o desacordo do que uma boa relação. Mas, um acordo entre países sempre significa um avanço nas relações, teoricamente benéfico para as partes. E principalmente coloca as regras claras mediante as quais essa relação evolui.
Hoje em dia tem muita falácia sobre a abertura do Brasil, país segundo alguns mais fechado do mundo, e a assinatura de novos acordos com blocos ou países. Mais recentemente, houve a declaração do Ministro da Economia Guedes, que disse que temos que fazer um acordo de livre comércio com a China. Primeiro precisamos esclarecer que quem negocia os acordos comerciais pelo Brasil é o Ministério de Relações Exteriores, conhecido como Itamaraty. Claro que negocia em nome do governo, do país, mas são os diplomatas que negociam.
Bem, antes de fazermos um acordo com China, vale a pena ver o que temos de acordos em curso e em negociação. Primeiro está o nosso acordo mais amplo e menos eficiente, que é o Mercosul. Nele o Brasil tem o seu maior superávit de exportações de produtos manufaturados e tem uma relação mais intensa e extensa. Mas, esse acordo precisa ser revisto, também no seu sentido mais amplo, como não só uma união aduaneira mas como um acordo de desenvolvimento regional. E neste momento essa parceria está sob hemorragia verbal dos líderes políticos dos dois maiores parceiros, o que não indica que haverá uma revisão proveitosa para o desenvolvimento dos países em questão. Aliás, tanto Bolsonaro como o Presidente eleito da Argentina já falaram que se não for do jeito que eles propõem (o Brasil que baixe tarifas externas, por exemplo), vão sair do Mercosul. Em resumo, se não arrumar o Mercosul, o Brasil não pode negociar acordos com outros países.
O Brasil também faz parte de inúmeros organismos internacionais, entre eles a Organização Mundial do Comércio, que precisa de uma revisão antes que a entidade se torne inútil. A OMC, dirigida por um brasileiro, pessoalmente muito capaz, foi sendo desdenhada como fator de avanço do comércio internacional, e, como todos sabemos, está moribunda, e no pior estágio da vida: nem viva e nem morta.
Fazemos parte dos BRICS que se reuniram esta semana em Brasília. Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul evitaram discutir problemas políticos e pela enésimas vez declararam sua intenção de incrementar o comércio intra bloco. Nada disso aconteceu até agora, a não ser avanço das exportações chinesas para Brasil e importação de commodities brasileiras pela China. Nosso comércio com outros membros é tão miserável que não vale a pena nem mencionar.
E na lista de espera está a ratificação do Acordo com União Europeia. Esse acordo, que verdade seja dita, vai afetar profundamente a estrutura produtiva do país, esta sob ataque tanto na Europa como em especial na Argentina. Ou seja, o caminho a percorrer na aprovação do acordo ainda é longo, tortuoso e às vezes parece incerto. Quase o mesmo vale para o acordo com a EFTA, Suíça, Noruega, Liechtenstein . Um acordo cuja negociação foi concluída, mas ninguém viu o que se concluiu. E nas mesma esteira estão os acordos com Coréia do Sul, Japão e quem mais quiser. Tem também entusiastas de nossa adesão ao acordo com países do Pacifico e agora com a China.
Em resumo, acordos e intenções de incrementar comércio não faltam.
Então, o que falta? Falta dizer com clareza que esses acordos fazem parte de um projeto econômico e social do país. Eles mudam não o nosso comércio externo, mudam a estrutura econômica e social do Brasil. Para os leigos é simples entender: o que vai se produzir no país, o que se vai importar, que empregos vai gerar. Que áreas vão desenvolver, e quais não. Onde vale a pena investir e onde não.
O fato é que esse projeto, se existe, está escondido e não é consensual no país. Hoje os acordos com a UE e EFTA nos empurram para um novo patamar de competitividade para o qual não estamos preparados. E pior, com avanços tecnológicos, indústria 4.0, inteligência artificial, 5 G etc., a situação só tende a piorar.
Precisa de um plano de aumentar a competitividade da sociedade brasileira. Não basta só a modernização do estado, que está lenta, mas de toda a base econômica e ai vai social, como educação e saúde entre outras, do país. Também só ajustar a infra estrutura e reduzir o Custo Brasil não será suficiente. Vai ajudar mas continuaremos a exportar matérias primas, por exemplo soja para a China e não farelo de soja para mesma China.
Fazer acordos, ou então anunciá-los, sem uma base de transformação que os mesmos exigem, é a parte mais fácil ou às vezes até irresponsável da história. Implementá-los para que criem uma sociedade mais equilibrada, justa, com mais e melhores empregos, esta é a parte mais difícil .