DO ACORDO UE MERCOSUL PARA PARCERIA
NON PAPER
1.Enquanto o Acordo UE-Mercosul é para a UE um acordo amplo de cooperação e parceria, os seus efeitos nos países do Mercosul serão muito maiores porque, através de uma aliança estratégica multilateral, mudam o paradigma de desenvolvimento econômico e consequentemente social.
2. Portanto, as consequências e efeitos na mudança serão diferentes nos dois parceiros.
Muito fortes nos países do Mercosul, notadamente, nesta ordem, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, e quase imperceptíveis nos países da UE, onde tão somente a expansão comercial de várias formas será motriz da relação. Nos países do Mercosul haverá mudança significativa no modelo econômico para implementar o acordo.
3.O Road map no Mercosul, começando pela ratificação nos parlamentos, vai depender do resultados das eleições na Argentina e Uruguai, mas especificamente no Brasil vai depender da situação política, da qual o Acordo passará a fazer parte.
4.O Acordo, do ponto de vista do Brasil, só foi possível porque o próprio Presidente da República liderou o processo e permitiu uma negociação que concluísse o acordo.
Por outro lado, quando o acordo foi concluído, o Presidente da Republica e seu governo não tiveram os ganhos políticos esperados. Parte porque a comunicação de tão importante ato, como em geral está acontecendo na comunicação do governo, foi falha, mas principalmente porque imediatamente começaram na UE debates sobre se o Brasil vai ou não cumprir o acordo especificamente no que se refere à parte ambiental.
Pesadas críticas, em especial do Presidente Macron, e atitude considerada provocativa do seu Ministro de RE visitando ONGs no Rio de Janeiro, abriram espaço para os EUA, hoje parceiro preferencial para oferecer alternativa, e abriram uma indesejável postergação do acordo Mercosul-UE. E se a isso se acrescentar o desastre ecológico da Amazônia e seu tratamento pelos países membros da UE, notadamente França, conclui-se que temos um cenário bem adverso para a ratificação do acordo, como primeiro passo.
5. O acordo só será ratificado quando o Presidente da República Jair Bolsonaro decidir que deve sê-lo, assim como quando decidiu que deveria ser concluído. Mesmo se os parlamentares colaborarem, é do Executivo o privilégio legal de submetê-lo à apreciação do Congresso. E mais, a ratificação entra na negociação mais ampla entre o Legislativo e o Executivo, incluindo-se na barganha emendas parlamentares que não têm a ver com o assunto em pauta.
Como se trata do mais importante acordo internacional em décadas que o Legislativo terá que examinar, os debates podem transcender o clássico debate sobre um acordo e se transformar num debate mais amplo. Sua eventual aprovação poderá fazer parte do debate político, incluindo nisso já o processo de sucessão deste governo. E claro que vai ter uma influência forte nesse debate o estado social, com ênfase no desemprego, e o econômico, sobre o crescimento do pais.
6.O papel dos atores econômicos, através de suas entidades, pode ser fundamental para a implementação em vários níveis do acordo.
6.1. como durante a negociação do acordo, também agora não há consenso entre as entidades empresariais sobre as suas vantagens para seus associados. A resistência, em especial do setor automotivo e industrial alemão no país, espalhou-se pelos demais setores e pode vir à tona novamente. O fato é que se demorar a primeira fase, ratificação, você prolonga o processo de entrada em vigor do acordo e atrasa as mudanças que serão necessárias para a sua implementação;
6.2.as organizações oficiais, como Federações e Confederações, que dependem do governo, vão seguir a orientação do governo, suas prioridades e suas politicas. Aparentemente vão apoiar o acordo, mas não vão lutar nem para a sua aprovação no Congresso e nem na sua implementação, se não receberem a orientação clara, não do Governo em seus vários aspectos, mas do próprio Presidente da República, com quem dialogam, e seguem sua orientação política.
6.3.O setor agrícola, que independentemente do acordo tem na UE um grande mercado, pode ser o equilíbrio entre várias forças, e acelerar, inclusive por ter uma bancada forte e significativa no Congresso, a aprovação e influenciar o PR.
6.4. Área de serviços é dispersa no seu poder politico mas muito forte na área financeira, seguros, saúde, educação, serviços advocatícios, transporte e logística, telecomunicações, mas menos em serviços de engenharia.
6.5.Na parte que se refere à indústria, onde as transformações serão mais radicais, existem estudos que apontam que, com a implementação do acordo, haverá queda de até 20 % no PIB industrial. Haverá que tomar medidas que levem à mudança do paradigma básico do acordo:
o acordo deve levar a um novo patamar de competitividade da indústria brasileira e não à sua destruição.
Para isso serão necessários recursos. Do lado da UE, para financiar as empresas com investimentos no Brasil, e do lado brasileiro, as empresas brasileiras. Nada disso está sendo cogitado neste momento nem de um e nem de outro lado.
7. Concluindo, a implementação do Acordo não pode chegar a ser um tema negativo, mas os vários atores incluídos tem que afirmar, em especial do lado empresarial brasileiro, que o Acordo só pode ser implementado, nem postergado e nem esquecido.
Não há no momento nenhum outro acordo que Brasil possa fazer que, com todos os riscos, mude tanto o paradigma de competitividade do país e crie uma aliança estratégica tão importante como este Acordo.
A influência de acordos ou negociações com outros parceiros, em especial Estados Unidos e em seguida Reino Unido, não pode anular os benefícios do acordo com a UE.
Para isso um complexo road map politico e econômico deve ser feito no qual as Eurocamaras no Brasil, e suas correspondentes entidades na UE, terão papel fundamental. Neste capítulo, a voz, hoje fraca, das empresas europeias no Brasil, deve ser ouvida pela sociedade brasileira. Aliás, além de considerações fragmentadas, não existe um paper confiável da influência dos capitais europeus no desenvolvimento brasileiro.
Papel fundamental terão também instituições como a GV em promover debates e estudos que confirmem o rumo certo e os benefícios do Acordo para a sociedade brasileira.
Last but not least, se do lado europeu continuarem as declarações na linha pós-acordo, ou seja que não se acredita que Brasil cumprirá o acordo, não se pode esperar que do lado brasileiro haja um esforço para continuar no acordo. A UE também tem que decidir no seu conjunto se quer ou não o acordo, porque as condições de como será o acordo já foram acordadas. E o uso do acordo para reforçar não a sua implementação e beneficiar a todos os stakeholders, mas para incrementar o espaço eleitoral interno, pode custar a anulação do acordo.
Stefan Bogdan BARENBOIM ŠALEJ
30.8.2019.
Copyright Stefan Bogdan Barenboim Salej 2019.
O presente estudo se destina somente aos destinatários e só pode ser divulgado com expressa autorização do autor.
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