Minério de duas safras
Como fazer que uma tonelada de minério de ferro que custa aproximadamente 150 dólares se transforme em uma tonelada que vale 15 mil dólares? Para os quase oito mil representantes de mineradoras e de 100 países reunidos na Cidade do Cabo, África do Sul, este é um problema dos governos.
Mineradora minera e manda minério. E os países africanos que, com raras exceções, como a África do Sul, eram colônias dos consumidores de produtos minerais, são hoje países independentes com enormes problemas
quanto a marcos regulatórios na mineração, estabilidade politica e relações de
trabalho adequadas ao século 21. As minas nos demais países consumidores foram secando e os países mineradores da África são hoje grandes fornecedores, principalmente da China e da Europa. Mas o
capital ainda vem de Londres ou de Nova Iorque. E a tecnologia também.
A África vai sustentar o
desenvolvimento do mundo com sua riqueza mineral, foi o recado da Mining Indaba
(reunião em zulu). Mesmo com instabilidade
laboral e política, é de lá que vem o sustento da indústria de transformação, principalmente chinesa. A indústria de mineração mundial, que viveu uma fase de
excelentes lucros nos últimos anos, está hoje refazendo seus investimentos, suas prioridades e se ajustando a um
novo patamar de demanda, que exige menores preços enquanto os custos estão
crescendo. A demanda, e não só a chinesa, vai crescer em médio
prazo, mas muitos dos investimentos terão que ser ajustados aos novos tempos. E muitos executivos ainda vão ser trocados pelos desacertos nos investimentos.
O comovente discurso da CEO da Anglo American, Cynthia
Caroll, demitida entre outras coisas pelo desacerto do projeto Minas Rio, cujo
custo não para de crescer, e o discurso do
seu sucessor, defendendo o projeto e a demissão de 14 mil operários na mina da platina na África do Sul, onde o desemprego chega a 25 %, mostram quão dramática está a situação e quanto cuidado devem tomar as
empresas nos seus investimentos no futuro.
A Indaba de mineração africana também evidenciou a questão do retorno dos investimentos. Hoje, a maior parte dos ganhos vai para
os governos e diretorias das empresas. Os acionistas e trabalhadores estão no final da lista. E os governos querem cada vez mais, os
trabalhadores pressionam e os chineses pagam cada vez menos. Aliás, a reunião mostrou que os chineses são importantes compradores, mas não são importantes mineradores. Mas pertencem
a um dos raros países que tem uma visão estratégica do uso dos minerais.
Mesmo se a Odebrecht e algumas outras empresas também têm exploração mineral na - África, é a Vale, com investimentos em seis países e 7000 funcionários em mina de carvão em Moçambique, o mais importante player.
A exploração dos minerais na África é de fundamental importância estratégica para Brasil. Quando a Vale vai,
leva serviços, técnicos e equipamentos brasileiros junto. E com isso reforça a posição brasileira no mundo. Agora é só cuidar para que ela não passe pela crise da PETROBRAS, porque definitivamente Brasil não se pode dar o luxo de errar duas vezes.
Stefan B. Salej