DE BRINCANDO COM A VIDA: A VENEZUELA ATACANDO A GUIANA E O BRASIL
Na nossa fronteira norte com a Venezuela e Guiana os tambores de guerra são cada vez mais ruidosos. O governo venezuelano tem seguido um plano de conquista de 72 % de território da Guiana ponto por ponto. E criando um clima de unidade nacional, inclusive prendendo os opositores ao projeto, que, olhando para casos similares na história, claramente indica que de irracionalidade nada tem. Maduro tem um objetivo militar claro, que é tomar o território chamado Esequibo da Guiana, e político, que é se perpetuar no poder.
A Venezuela tem poderio militar para fazer isso. Com paraquedistas, toma conta da fronteira e das cidades próximas e cria um fato consumado. Pode criar focos de guerrilha e prorrogar o conflito por mais tempo. Um coisa que Maduro não vai fazer é nada. A reação de aliados da Guiana, cujas forças militares são pífias porque o país é minúsculo, 680 mil habitantes, como os Estados Unidos e o Reino Unido, não assustam Maduro. Ele quer ficar na história como alguém que, depois de 120 anos, teve a coragem de dominar um território que por arbitragem na época passou ser da atual Guiana. E ficar na história melhor que o seu antecessor, Hugo Chaves, de cuja sombra procura se livrar, o que vale mais do que qualquer outra coisa. Quem conhece Maduro sabe que está lidando com um desequilibrado com propósito.
O conflito, se prosperar, abre uma caixa de Pandora de disputas territoriais na América Latina. Mesmo o Brasil, que em 1898 perdeu parte do território de Roraima para os ingleses, que mantinham a Guaiana como sua colônia, com arbitragem do então Rei da Itália e sendo advogado o mais brasileiro Joaquim Nabuco, podem reivindicar. Sem falar nas disputas entre Bolívia e Chile e tantas outras que vão aparecer. Sem esquecer das Falkland Islands ou Malvinas, argentinas. Com eventual invasão da Venezuela, cria-se um precedente de imprevisíveis consequências.
E não se pode esquecer também o envolvimento de países extra continentais envolvidos no conflito. Maduro, cuja aliança com a Rússia, apesar de declarações do governo russo a favor de solução pacífica, é imprevisível e de outro lado os Estados Unidos, que já exploram petróleo do lado de Guiana, ou seja economicamente já ocuparam o território. Que tipo de guerra vão escolher, não se sabe, mas seja qual for, é de fazer muitos mortos e espalhar sangue pelos rios e florestas amazônicas. Inclusive pode atingir a população de cidades fronteiriças brasileiras.
O Brasil já esta envolvido até o último fio de cabelo no conflito. Primeiro, desde o governo FHC e com mais força nos quatro governos do PT, passamos de simpatia para absoluto apoio à implementação do chavismo na Venezuela. No governo Temer, mudamos de atitude e lideramos a expulsão da Venezuela do Mercosul. No governo Bolsonaro, fomos do amor para o ódio. Rompemos até relações diplomáticas. E daí perdemos, por um erro imperdoável do ponto de vista de política externa, a oportunidade de sequer saber o que acontece na Venezuela.
Cabe porém salientar, o que foi visto em vários seminários e debates na USP, que quem tem conhecimento profundo de situação na Venezuela são os militares brasileiros. E aí esse conhecimento não pode ser superado por amizades políticas em prejuízo da real situação militar.
Com a chegada do novo governo Lula, começou de novo a fase de amor. Foi este governo que deu aval internacional e articulou a promessa de nova fase do governo venezuelano. Diga-se de boa fé, inclusive com a promessa não só de eleições limpas como também de pagamento de dívida bilionária que o país tem com o Brasil.
Maduro com a sua atitude na questão de Guiana definitivamente enterrou o governo brasileiro. Não foi uma uma traição simples. Maduro desacreditou Lula perante a opinião pública brasileira. A oposição, que sempre teve a relação dos governos do PT com a Venezuela, inclusive com os créditos concedidos, como a bandeira de incompetência e da política externa e prejudicial aos interesses nacionais, está de festa. Não precisa nem falar, estão aí os fatos.
E tem mais, se o governo brasileiro não tomar medidas muito firmes na defesa de seu território, certamente duas dúzias de blindados não convencem ninguém, pode ser acusado pela oposição de quebra de preceitos constitucionais com consequências jurídicas e políticas imprevisíveis. Ou seja, a crise provocada pelo Maduro bate na trava da política brasileira. Inclusive no questionamento de nossa capacidade militar de agir em defesa do país. Salvo engano, esse é, após a Guerra do Paraguai, o primeiro provável conflito nas nossas fronteiras em 150 anos.
A nossa capacidade de reagir tem limitações em diálogo diplomático já que as embaixadas em Caracas e Georgetown estão sem titulares que não foram, devido aos trâmites de aprovação no Senado, ainda aprovados para assumir o cargo. Pode-se dizer em público que queremos paz, mas o que aparenta neste momento, que Maduro quer sangue, e esse sangue vai respingar não só no governo brasileiro, mas no país como um todo.
Nesse lamentável episódio que estamos vivendo, ao lado de ataques de Hamas em Israel, da invasão russa de Ucrânia, está sendo testado se Brasil tem ou não a liderança suficiente para impedir o conflito. Subestimar Maduro e quadrilha dele lembra como na história subestimamos ainda no nosso tempo de vida os líderes irresponsáveis e populistas que levaram milhões de pessoas à morte.
No mundo inteiro acreditam na capacidade de Lula e na diplomacia brasileira de evitar esse conflito. E esperam que a exerçam. O cenário contrário é absolutamente assustador.
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