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Sunday 24 March 2019

DE MINAS PERDIDA

DE MINAS PERDIDA

Cesar esta nu, gritou o ator na famosa peça teatral, de que as crianças gostam tanto.

O excelente estudo sobre o impacto da crise na mineração de ferro em Minas Gerais, após o calamitoso desastre de Brumadinho que matou mais de 200 pessoas, e ainda continuam desaparecidas mais de 80, feito pela FIEMG, é no fundo isso: Minas Gerais nua. Segundo resumo executivo desse estudo,  a queda de produção mineral no Estado, em qualquer situação, vai provocar desemprego, quebra de empresas, situação social calamitosa, falta de matéria prima para as siderúrgicas, cuja produção vai afetar a cadeia minero-siderúrgica que inclui a indústria automobilística, entre outras e, em resumo, queda do PIB do estado neste ano em 6.5 %.

O anúncio, feito pelo próprio presidente da entidade na imprensa nacional e internacional, teve, junto com o desastre da situação fiscal e financeira  do estado, um efeito de bomba atômica. Minas não só esta quebrada hoje, mas vai precisar de muitos anos para  se recuperar, porque a sua espinha dorsal econômica está quebrada e é de difícil recuperação. Portanto, os investidores, de um lado já assustados com aspectos relacionados a meio ambiente, seus stakeholders não aceitam politicas irresponsáveis nesse setor do estado, se assustaram mais porque o estado não pode oferecer nada ao investidor a não ser caos social, econômico e financeiro. Pelo menos essa é a conclusão dos anúncios que foram feitos na imprensa junto com o estudo divulgado.

A primeira pergunta é por que as entidades empresariais mineiras não fizeram esse estudo após o desastre de Mariana. Será que é cego quem não quer ver? Falharam, seja por qual razão for, e o resultado esta aí.

Um segundo ponto é que o diagnóstico e o prognóstico da FIEMG não falam em soluções para reverter a situação. As sirenes continuam tocando, a população assustada, e os corpos enterrados ou desaparecidos. E quais são as soluções para reverter isso? Quem lidera esse processo? A FIEMG, as entidades setoriais ou o governo, que por sinal nem um diagnóstico como esse fez?

Para começar, nem tudo em Minas é desastre. Veja só os balanços da MRV e Localiza, start ups, economia do Sul de Minas e do Triângulo.

Depois, em Minas não faltam pessoas que possuem conhecimento para achar soluções e formatar um novo tempo. Já aconteceu no passado e foram encontradas soluções. Talvez o momento não havia sido tão trágico como agora, mas Minas e os mineiros acharam a saída.

O que falta é diálogo, que é o nome de Minas. Todos os atores envolvidos têm que dialogar para encontrarem soluções para a profunda crise por que Minas está passando. Não se pode impor opinião, interesses de um grupo de empresários ou de um setor sobre os interesses da sociedade. Agora, se todos estão conscientes da gravidade, por que não se unem e fazem um projeto de saída de crise e volta do crescimento? Por que será?

Sunday 17 March 2019

DA JUSTIÇA MAL COMPREENDIDA

DA JUSTIÇA MAL COMPREENDIDA

Os Ministros do Supremo Tribunal Federal, corte mais alta da justiça brasileira, estão revoltados com as reações do povo brasileiro às suas atitudes, às suas decisões e a seu comportamento. Além de fazer declarações sobre a independência dos poderes, ameaça à democracia, porque ela só funciona com justiça independente e respeito a lei, e combate a fake news, notícias falsas, os ministros e as ministras estão indignados com a percepção do povo brasileiro a seu respeito.

E eles estão com razão. Com toda a razão. Porque eles nunca assistiram aos vídeos de seus julgamentos, suas falas, suas expressões faciais, corporais e verbais. O povo assiste, e como o povo sempre é ignorante e os onze ministros da corte são o supra-sumo de nosso conhecimento, nossa ética, nossos valores e nosso amor à justiça, o povo tira conclusões erradas a respeito deles, suas decisões e  seus julgamentos. Portanto, vamos educar o povo, dizer a eles que somos guardiães de sua democracia através de nossa independência. Somos, dizem os ministros, nas declarações da semana, poder, repito poder, independente.

A justiça é um complexo de compreensões que persegue a humanidade. Desde a justiça divina até a justiça dos homens, interpretada a gosto, interesse, compreensão de cada tempo, grupo político, donos do poder e até interpretações  pessoais.

Mas, a justiça dos homens que fica, e a história comprova isso, e que constrói umas sociedade democrática sólida, é aquela que atende através de uma estrutura jurídica executada pelo sistema judiciário e penal, não às minorias, mas à maioria de seu povo. Então, a independência do judiciário não é independência do povo que ele atende, de seus problemas, sua segurança jurídica, sua igualdade perante as lei e demais predicados da vida comum. Ser independente neste caso não quer dizer que tem que julgar interpretando a Constituição, contra a vontade do maioria do povo. E nem ficar ofendido quando o povo lhe diz que não concorda com as decisões.

E aí vem um outro problema da estrutura jurídica. A Constituição de 1988 permite tantas emendas e tantas interpretações que  estas criam uma confusão político-social-penal que se chama insegurança jurídica. E junto vão as nossas leis, que são novamente feitas para criar insegurança de interpretações e engordar os bolsos de defensores das leis, alguns deles  oriundos das mais altas cortes do país. O caos começa no Congresso, onde se fazem leis, e continua pelo judiciário, que na sua maioria procura ser justo, eficaz e democrático. Sem falar na execução das sentenças, interpelações eternas e um sistema econômico financeiro que gira em torno dessa confusão e complexidade jurídica. E com quase um milhão de presos, um sistema prisional dos piores do mundo.

Então, a revolta dos mais altos juízes da nação está certa. O errado é o alvo, o povo revoltado com a situação, com a insegurança jurídica que vivemos e ainda vamos viver por muito tempo.


Sunday 10 March 2019

DA PARTITURA DE MINAS

DA PARTITURA DE MINAS

Acabaram de cantar as últimas marchinhas de carnaval. Mesmo cantadas  com imensa alegria na tristeza da tragédia de Brumadinho, elas são tocadas e cantadas de uma forma organizada. Cada instrumento tem sua função, cada músico sabe o que tocar e todos eles têm um maestro que os ajuda no ensaio e guia na apresentação. E imagina como isso funciona quando na Sala Minas Gerais, belíssima por sinal, toca a nossa Orquestra Sinfônica a 9ª Sinfonia de Mahler. Os aplausos no final são para o maestro, para a orquestra, pela execução de uma obra centenária claramente exposta na chamada partitura. E isso vale também para quando ouvimos os músicos mineiros, sejam do Sepultura, Skank, Milton Nascimento, Fernando Brant, Ary Barroso e tantos outros.

E na economia mineira, tem partitura?

Neste exato momento, cada um toca um instrumento de acordo com sua vontade de ouvir e tocar o que lhe interessa.

O Governo está iniciando a sua jornada sob imensa pressão de caixa, tornando essa questão sua absoluta prioridade. E nesse aspecto não conta com a colaboração dos políticos, que vivem reclamando e não conseguem por outro lado dar a sua contribuição. Por incrível que pareça, os setores sindicais colaboram mais do que os políticos. Os prefeitos reclamam, mas por outro lado não há uma prefeitura sequer em Minas que faça algum ajuste nas suas contas, sem falar da vergonhice que representam as câmaras de vereadores e a assembleia legislativa nos seus gastos, superando qualquer orçamento de educação e saúde no estado. E ninguém se mexe, só reclamam.

Por outro lado, o governo do estado não  tem nenhum plano de melhoria de gestão e nem de desenvolvimento econômico. Aliás, isso deveria ser feito antes de começar o governo, foi  feito em São Paulo. Se não tem plano, se não tem partitura, como fica a música? Um desastre. Se perguntar hoje a  qualquer integrante do governo mineiro quais as previsão do PIB do estado neste e nos próximos anos, não tem resposta. Pelo menos ninguém até agora falou nisso. Então, simplesmente, como vamos nos desenvolver, crescer, se não temos objetivo, rumo e prumo? Não temos plano estratégico num momento de  profunda transformação da economia.

As entidades empresariais, com honrosa exceção da agro, estão olhando para seu umbigo, defendendo seus interesses corporativos e os de suas lideranças, sem nenhum projeto para Minas Gerais a ser apresentado ao governo para criar parceria de desenvolvimento. A FIEMG, com orçamento de mais de um bilhão de reais, a FECOMERCIO, com outro tanto, sem falar nos transportes, serviços, SEBRAE, não são capazes de produzir, além de reivindicações, uma proposta no modelo do CRESCE MINAS na época do Itamar Franco, que deu a Minas um rumo no seu desenvolvimento através da introdução da metodologia de clusters. Empresários precisam levar projetos ao governo e não reivindicações. Mas o governo também precisa saber para onde vai e como.

A crise provocada por desastres na área mineral não pode cegar as necessidade de um plano de desenvolvimento. Ao contrário, a lição deve ser aprendida e aproveitada para uma nova fase.

Stefan Salej
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice Presidente do Conselho de Comércio Exteriore da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT Grupo de análise da conjuntura internacional da USP

Monday 25 February 2019

DO CARNAVAL E POLÍTICA OU CARNAVAL POLÍTICO


DO CARNAVAL E POLÍTICA OU CARNAVAL POLÍTICO

A nítida impressão é que o feriado de que os políticos latino-americanos mais gostam é o carnaval. Nos feriados religiosos, tem que ajoelhar e rezar. Nos feriados republicanos, tem que cantar hino nacional, mostrar seriedade e dedicação à pátria. No carnaval, mesmo às vezes sendo chacota, eles se misturam ao povo, que perdoa tudo, esquece tudo e dança até quarta-feira de cinzas, quando nada mudou, mas ficou ainda a alegria retida do carnaval.

E mais: nesta semana de carnaval, tudo pode acontecer, como nada pode acontecer. Comparando, em Minas ainda não enterraram as vítimas de Brumadinho, somados os mortos e desaparecidos o número ultrapassa 300 pessoas, e o carnaval em Belo Horizonte vai de vento em popa, como se a 40 quilômetros de distância tivesse acontecido o evento mais alegre do mundo, e o que temos do outro lado da Amazônia, a Venezuela. Lá, segundo o presidente com chave da cadeia e do cofre Maduro, o carnaval começa na quinta-feira e vamos ver o que acontece.

Aliás, as duas situações tão diferentes têm uma característica comum: ninguém sabe como vão terminar. Em Minas, as barragens estão pipocando, investidores são  cautelosos e a Vale vai se salvando em nome de ser a joia da coroa da economia brasileira. Imagina, se não fosse, como não estaríamos. Provavelmente, ao  invés de 300 mortos e desaparecidos, com número muito diferente. Então, obrigado à joia da coroa.

Na Venezuela está se criado um impasse de governabilidade e com começo de primeiros conflitos a bala, que não está indicando nenhuma solução. A complexidade da confusão é de tal tamanho que o governo Maduro, que não tem dólares para comprar papel higiênico, autorizou a exploração de minas a céu aberto de ouro no melhor estilo de Serra Pelada. Mais de 300 mil garimpeiros procuram ouro, vendem pepitas aos atravessadores do governo, que os manda para a Turquia, onde o ouro é refinado e vendido. Então, além da Rússia, China, Estados Unidos e países vizinhos, ainda tem como enxeridos a Turquia e o grupo terrorista Hezbollah, dominado pelos iranianos.

O Brasil, que foi fiador nos governos Lula e Dilma da Revolução Bolivariana e forneceu créditos de mais de 50 bilhões de dólares a Chavez e Maduro, sabe atualmente o perigo que representa uma solução sangrenta de mudança do governo em Caracas. E também que, se houver uma eleição, por mais bem supervisionada que seja, Maduro pode ganhar, porque os eleitores que votariam contra saíram do país e não podem votar. E tem mais: armaram o povo, milícias populares ou “colectivos”, que fogem ao controle das forças regulares, mas não dos consultores cubanos que dominam as forças de segurança venezuelanas. O Vaticano, que poderia mediar, está cuidando de pedofilia. A ONU está sem voz. E Guaidó, Presidente apoiado por europeus e Trump, sem chave de cadeia nem comando do território.

E aí, todos torcendo para que o carnaval, seja cá ou lá, traga, através da alegria, a luz que mudará Minas e Venezuela.

Stefan ŠALEJ 
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice-Presidente do Conselho de Comércio Exterior da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT da USP












Sunday 17 February 2019

Do sinal amarelo para os investimentos em Minas



DO SINAL AMARELO PARA INVESTIMENTOS 

O que em Minas, e em especial suas elites econômicas, menos querem ouvir é que os desastres do setor de mineração têm uma repercussão maior do que elas acham. A ausência do atual presidente da maior entidade industrial do estado, não voltando do exterior para liderar a resposta do setor industrial ao acidente em Brumadinho, mostra como as pessoas que são responsáveis pelo desenvolvimento do estado reagem: veja se passa e esqueçamos o assunto. Memória curta, é o que todos estão querendo. Vamos olhar para o futuro, esqueça o passado ou, como um gênio da liderança industrial disse: temos que ser racionais neste momento.

Uma coisa é como as elites mineiras e a direção da Vale querem que isso seja visto. Outra coisa é a dor das famílias. E o terceiro item nessa percepção é como o mundo nos vê.

As empresas hoje têm acionistas estrangeiros, ou diretos ou através  de fundos de investimentos. Isso vale para a MRV, Kroton, Localiza, CEMIG, Anglo American, Nestlé, Copasa, FCA, e assim adiante. E a maioria desses fundos têm regras de governança rígidas, em especial quanto ao meio ambiente. Essas empresas inclusive cumprem as regras. Mas, o acidente em Brumadinho espalhou a dúvida sobre como o estado de Minas administra essas questões. 

E os acionistas e as gestoras desses fundos já começaram a questionar se a lama e os assassinatos lá atingiram empresas e áreas onde atuam. Ninguém quer estar associado a empresas e sistemas que provocam esse tipo de desastres. É pura ilusão achar que Brumadinho como Mariana, não vão afetar novos investimentos no estado. Ao invés de virem investidores responsáveis, o Estado vai abrir o caixa, piorando a situação, aos mais depredadores e usurpadores dos cofres públicos.

Uns primeiros sinais de como a imagem de Minas destruída tem afetado já aconteceram. Já começam a ser cancelados novos investimentos na área de agronegócios. E não se iludam porque que na decisão sobre a nova fábrica de motores da FCA em Betim isso vai pesar. 
O sinal amarelo acendeu.

A solução não passa por melhor comunicação, veja o desastre que é a comunicação da Vale, mas por demonstração clara e inequívoca do chefe do governo mineiro. Aliás, como o novo presidente da CEMIG chamou o governador, de que o passado não vai se repetir e que o futuro é qual mesmo? Só a autoridade moral e a liderança do governador podem garantir que haverá mudança e que em Minas o meio ambiente terá um novo tempo. Fazer isso, com o secretário da área do governo anterior perambulando pelos corredores do mal feito do novo governo e apoiado pelos ilustres industriais, será difícil.

O governo tem poucas opções e se, não mudar de fato o paradigma de desenvolvimento e mostrar isso aos investidores, nem o novo presidente do BDMG trazido da China vai resolver. Não se trata de imagem, mas de mudança de fatos que engalanaram e ensanguentaram o retrato de Minas.

Com a palavra Governador.

Stefan Salej
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice Presidente do Conselho do Comércio Exterior da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT Grupo de acompanhamento da conjuntura internacional da USP 

Sunday 10 February 2019

A



DA BÚSSOLA MORAL E ÉTICA 

Mortes e mortos. Famílias que perderam filhos, maridos, esposas, destruídas para sempre. A dor que não desaparece. A dor que fica mesmo recompondo a vida.

Brumadinho. Ceará. Chuvas no Rio. Tragédia da Raça Rubro-Negra no Rio de Janeiro. O campeão mundial de assassinatos e de acidentes de trânsito. E de acidentes de trabalho. E a  segunda maior população carcerária do mundo, sem falar em condições sub-humanas em que estão nossas prisões.

Para alguns, eventualmente mais religiosos, é castigo de Deus. Pode ser.

Mas, em tudo isso tem a mão do homem, da pessoa humana. Aqui cabe bem a pergunta, que país é esse, que gente somos.

Os desastres de Mariana e Brumadinho já foram muito debatidos e suas consequências ainda não terminaram . Onde prevaleceu a ganância sobre a segurança das pessoas, continua prevalecendo o interesse financeiro sobre a solução para as famílias e a sociedade. Responda  você mesmo, sem se deixar influenciar pelas ações de comunicação liderados pelo genial mago da comunicação brasileira Nizan Guanaes, que assessora a Vale e tenta nos convencer de que tudo isso não tem importância porque vamos continuar exportando minério e tendo dividendos e valorização das ações da empresa.

No caso dos garotos do Flamengo, é impressionante a como maior parte dos comentários, até do porteiro do meu prédio, é sobre quanto perderam o clube e os jogadores, além dos intermediários, já que todos eles eram talentos que podiam ter contratos no exterior. Escravos esportivos, ilusões e sonhos interrompidos dos dirigentes e famílias. Será que as famílias não sabiam em que condições eles vivia?  “Aguente, início da vida é assim. Veja hoje como está o Neymar. Você vai chegar lá.” Dos dirigentes do clube e até dos torcedores. E quem será culpado pelo assassinato desses jovens? Quem tem coragem de dizer na cara dos dirigentes do clube, ou dos dirigentes das empresas envolvidas em Brumadinho e Mariana, que ajudaram a assassinar pessoas?

Porque foi a negligência deles que provocou os acidentes.
E isso acontece com as enchentes pelo país afora, onde os administradores públicos e os políticos põem a culpa em São Pedro, há sim excepcionalidades, mas não são capazes de fazer  obras decentes e duradouras. Aliás, por outro lado, quando fazem também o eleitorado na maioria das vezes não reconhece e não os elege. É um círculo vicioso da política brasileira que beneficia a enganação, o desleixo e a irresponsabilidade.

Com milhares de exemplos que sempre levam ao desdém da nossa sociedade com a vida humana, a pergunta que se coloca  é quando as  elites brasileiras, sejam políticas, religiosas, econômicas ou sociais,  vão liderar as mudanças para que isso não aconteça mais. Será que novas gerações estão prontas dentro de regime democrático para liderar essas mudanças? Ou vamos continuar sem nenhuma bússola moral e ética marchando para um abismo de onde a volta para uma sociedade pelo menos decente e respeitosa com a vida será quase que impossível.

Insistir que essa mudança pode começar pelas lideranças empresárias faz parte do meu credo pessoal, que é possível e deve ser feito. Mas, a esperança é a última que morre.

Stefan Salej
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice-Presidente do Conselho do Comércio Exterior da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT Grupo de acompanhamento de conjuntura internacional da USP

Sunday 3 February 2019

Da responsabilidade empresarial


Da responsabilidade empresarial 

O episódio trágico de Brumadinho abriu  mais uma vez a discussão sobre a responsabilidade social, ambiental, e econômica das empresas e dos empresários. A versão, no caso específico da Vale, é que a empresa é um exemplo de responsabilidade social e ambiental. O fato é que nos últimos três  anos morreram em acidentes mais de 120 pessoas nas instalações da empresa. E o fato prevalece sobre a versão.

A questão é qual o grau de confiabilidade tem a tal “responsabilidade social corporativa (RSC)” após os fatos que mostram que os programas são falhos e funcionam só enquanto não acontecem desastres. O assunto não é novo no mundo empresarial e um dos primeiros acidentes ocorreu na Índia, quando vazou líquido tóxico e matou muita gente. E a esse acidente se seguiram vários e empresas foram sempre punidas e suas imagens bem arranhadas. Há empresas alemães que hoje são grandes campeões de ética,  que colaboraram com o governo nazista no genocídio dos seis milhões de judeus.

Aqui no Brasil, inclusive nos casos mais recentes, não temos quem verifique, além da imprensa e de instituições contaminadas, a veracidade da RSC. E então se acredita em quem tem mais poder na mídia, que é melhor. Os últimos acontecimentos terão que mudar os critérios, inclusive com maior adoção de normas internacionais nessa área, com a devida cerificação. Mas, aí também tem problema, já que um dos maiores certificadores é exatamente a empresa alemã TUV, que atestou que a barragem de Brumadinho estava perfeita.

Uma outra questão é o papel das entidades empresariais. Em Minas, e em especial na atual gestão da FIEMG, discute-se muito a defesa da indústria. De fato, há muito a se fazer na defesa das parcerias da indústria com a sociedade, onde inclusive faltam iniciativas e projetos. Mas, como defender os próprios mineradores que no caso específico quebraram Minas Gerais e provocaram tantas mortes? Não há como negar que a opção de desenvolvimento a favor do empresariado mineral, em conjunto com os políticos, foi o que prevaleceu em Minas desde a descoberta do Brasil. Essa ilusão de riqueza e sua exploração, muito mais a favor dos exploradores do que da nação como um todo, foi poucas vezes discutida. Minas com sua elite empresarial e política preferiu leniência do que uma transformação de sua economia.

Acabaram com a melhor escola de engenharia de Minas do Brasil. A FIEMG protegeu, com entidades como o IBRAM e os respectivos sindicatos do setor, o gangsterismo em detrimento do bem comum, inclusive empresarial. E junto com políticos que não são capazes de encontrar outras fórmulas para o desenvolvimento, criou-se uma ciranda que levou, com um sistema judicial omisso e parceiro da ciranda, às consequências de quebra de Minas e a mortes que todos vão ter nas suas consciências. A impunidade do passado gerou os acontecimentos atuais. 

Acordar para mudar o paradigma de desenvolvimento com os cadáveres que o sistema produziu é muito triste. Mas, absolutamente necessário. E neste momento as entidades empresariais têm que ter proposta de mudança  porque o que aconteceu está na conta de todos e cada um.